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Transístor topológico consome 10 vezes menos energia que transístor de silício

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Isolantes topológicos

O que todos esperavam, um tanto ansiosamente, acaba de acontecer.

Pesquisadores australianos conseguiram demonstrar o funcionamento de um transístor – o componente fundamental da eletrônica e da computação – usando a promissora classe de materiais conhecidos como isolantes topológicos, materiais que apresentam várias características interessantes porque suas propriedades eletroeletrônicas são diferentes em sua superfície e em seu interior.

Os ganhos não são pequenos: As primeiras estimativas dão conta de que um transístor topológico apresenta perdas de energia que são, no mínimo, 10 vezes menores do que as perdas dos mais modernos transistores de silício.

Isso significa um alento para o mundo da computação, que já é responsável pelo consumo de cerca de 8% da energia produzida em todo o mundo.

E a equipe já deu um passo adicional, projetando uma versão ainda mais avançada, em que seu transístor topológico tira proveito de um fenômeno só recentemente demonstrado, conhecido como capacitância negativa.

Transístor básico

Um transístor é uma chave eletrônica. Ele tem três terminais: Uma tensão aplicada ao terminal da base controla a corrente que pode fluir entre os outros dois terminais (chamados de coletor e emissor). Nos chips, os transistores podem estar “ligados” (ou seja, a corrente pode fluir) ou “desligados” (a corrente está bloqueada), representando os 1s e 0s necessários para as operações lógicas binárias.

Assim, ligar e desligar um transístor – gravar ou alterar seu dado – requer uma pequena quantidade de energia elétrica a cada vez. Então some os milhões, ou mesmo bilhões, de transistores nos chip e processadores mais modernos, e a conta de energia sobe rapidamente.

Os transistores de hoje são todos feitos de silício, que é um semicondutor. Ocorre que os semicondutores são isolantes, exigindo uma dopagem com átomos de outros elementos e a aplicação de uma carga elétrica extra para tornar-se condutor. Esse é o princípio do tão conhecido transístor de efeito de campo (FET): A base é conectada por um capacitor a uma fatia do semicondutor que passa entre os terminais coletor e emissor. Uma tensão aplicada na base carrega o capacitor, e sua carga extra em contato com o semicondutor permite que a corrente flua, ligando o transístor, ou passando-o de “0” para “1”.

O professor Michael Fuhrer na apresentação online em que a equipe descreveu seus resultados com o uso de isolantes topológicos para construir transistores.
[Imagem: Michael S. Fuhrer et al. (2021)]

Transístor topológico

Um material isolante topológico é mais interessante porque, embora ele também não conduza eletricidade em seu interior, como o silício, ele conduz naturalmente em sua superfície, sem qualquer dopagem.

Se ele for fabricado em uma forma tridimensional, ele irá conduzir eletricidade em suas superfícies bidimensionais; se ele for fabricado em camadas muito finas, monoatômicas, ou bidimensionais, ele irá conduzir ao longo de suas bordas unidimensionais.

Michael Fuhrer e seus colegas do Instituto Fleet, na Austrália, conseguiram finalmente tirar proveito dessas características para construir transistores funcionais e com um consumo de energia muito baixo.

Fuhrer descobriu como usar um campo elétrico para transicionar um material isolante topológico (que conduz eletricidade ao longo de suas bordas) em um isolante normal (que não conduz de forma alguma), o que permite que um material topológico seja usado como um transístor. Ele batizou seu novo transístor de TQFET, ou transístor de efeito de campo quântico topológico.

O TQFET pode alternar seus estados com uma tensão mais baixa do que um FET convencional, superando a chamada “tirania de Boltzmann”, que define o limite inferior para a tensão necessária para alternar uma corrente em temperatura ambiente. “A comutação de baixa tensão ocorre devido a um efeito chamado acoplamento spin-órbita, que é mais forte em elementos mais pesados como o bismuto. Descobrimos que os TQFETs baseados em bismuto poderiam alternar na metade da voltagem e um quarto da energia dos FETs convencionais de tamanho semelhante,” contou o pesquisador Muhammad Nadeem, da Universidade de Wollongong e membro da equipe.

O plano agora é passar dos TQFETs para os NC-TQFETs.
[Imagem: Michael S. Fuhrer et al. (2021)]

Transístor com capacitância negativa

Como se não fosse bom o suficiente, a equipe ainda descobriu como tirar proveito de uma outra propriedade inusitada, descoberta recentemente, a capacitância negativa, e usá-la no capacitor do seu transístor TQFET.

Um capacitor consiste em dois condutores separados por um isolador. O componente apresenta uma capacitância C, que expressa a quantidade de carga elétrica Q nos metais quando uma tensão V é aplicada entre eles: C = Q/V. Normalmente, este é um número positivo, mas, se ele for negativo, o capacitor ficaria instável e poderia carregar sem a aplicação de nenhuma tensão externa.

Mas isso é exatamente o que um material ferroelétrico faz: Ele tem uma polarização espontânea, que carrega suas superfícies. Portanto, um material ferroelétrico pode ser considerado como tendo uma capacitância negativa em um determinado regime, embora esse regime não seja normalmente acessível porque é instável.

Já existem várias tentativas de explorar os capacitores negativos na eletrônica, incluindo um transístor com capacitância negativa, mas ninguém conseguiu tirar proveito do fenômeno nos FETs tradicionais porque a queda de tensão necessária para carregar o capacitor devida à capacitância negativa simplesmente desaparece pelo próprio projeto muito aprimorado de construção dos transistores FET atuais.

Mas as coisas são diferentes no TQFET. A adição de uma capacitância negativa, na forma de um material ferroelétrico, para fabricar um TQFET de capacitância negativa (NC-TQFET) na verdade amplifica o campo elétrico, o que permite a comutação em tensões e energias muito mais baixas. “O TQFET usa o campo elétrico para chavear, então pode se beneficiar diretamente da amplificação do campo elétrico que é fornecida pela capacitância negativa,” disse o professor Jared Cole, da Universidade RMIT.

A equipe calculou que um NC-TQFET feito com bismuto e usando háfnio (HfO2) dopado com lantânio (La), um material ferroelétrico que já foi integrado com sucesso ao silício, poderá chavear de ligado para desligado com uma energia 10 vezes menor do que um FET de silício de última geração. “Há ainda mais espaço para melhorias,” disse Fuhrer. “Ferroelétricos mais avançados com polarizações remanescentes maiores poderiam permitir a troca em energias ainda mais baixas.”

Mais do que Moore

No entanto, se o progresso está firme nos TQFET, vários desafios ainda terão que ser vencidos para fabricar um NC-TQFET funcional. Isolantes topológicos baseados em bismuto com a estrutura adequada ainda precisarão ser fabricados e testados, e integrar esses materiais com camadas ferroelétricas representa outro desafio nada desprezível.

Ainda assim, o NC-TQFET fornece um plano claro para reduzir a energia em futuros transistores.

Não por acaso, os transistores topológicos foram adicionados no ano passado ao IEEE International Roadmap for Devices and Systems, o plano internacionalmente acordado que orienta os avanços na tecnologia de semicondutores, conforme mapeado pela famosa Lei de Moore – o roteiro agora já inclui planos delineados como “Mais Moore”, “Mais do que Moore” e “Além das tecnologias CMOS”.

 

 

 

João Marcelo de Assis Peres

joao.marcelo@guiadocftv.com.br

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